sábado, 26 de dezembro de 2009

Diálogo X

Sobre como adquirir material de campo, as primeiras actividades extra-sede, o primeiro acampamento de Unidade, a importância da experiência prévia, e o que o chefe Quim faria


1

— «Eu estive a pensar", dizia Ròmeo, "como vamos adquirir o material de campo necessário para as actividades do Grupo Explorador?»

— «Se um agrupamento vive de mensalidades, é provavelmente daí que virá toda sua renda. Não herdaremos material algum, porque começaremos do zero. Mas, como o primeiro acampamento será apenas para uma Patrulha, já que os Guias devem ter alguma experiência prévia antes mesmo do primeiro acampamento de Unidade, não haverá problema algum. Podemos contar com nossas tendas. Para os chefes bastará uma. Para os rapazes, uma ou duas são suficientes. Isso depende do tamanho delas. Podemos, ainda, conseguir algumas tendas emprestadas se for o caso. Devemos ter em mente que adultos e jovens nunca compartilham a mesma tenda, e que cada elemento, adulto ou juvenil, tem seu próprio leito. Imagina um dirigente e uma dirigente que sejam namorados. O melhor momento para que compartilhem o leito não seria numa actividade escutista.»

— «Mas quanto a ter material próprio de campo?»

— «De um modo ou de outro, provavelmente teremos de o comprar. Para uma Patrulha de oito elementos, por exemplo, é boa ideia adquirir duas tendas, mas não duas com espaço para quatro ocupantes cada uma. Devemos imaginar que o quinto elemento pode muito bem ser representado pelas mochilas. Desse modo, duas tendas de cinco lugares cada uma seriam o ideal para uma Patrulha de oito, a não ser que realmente gostes de construir aqueles mochileiros do lado de fora da tenda. Em todo caso, se enviamos uma Patrulha de 5 elementos a uma actividade regional, sempre se pode dormir com as pernas sobre as mochilas, de maneira a não termos de levar duas tendas de 5 lugares cada uma para acomodarmos uma Patrulha de 5 elementos. Não é lá muito confortável, mas...»

— «Disseste "comprar". De onde viria o dinheiro? Não temos nenhum patrocínio à vista.»

— «Ao que tudo indica, nosso agrupamento viverá de mensalidades. Ao menos a curto prazo. Então suponhamos que tenhamos já um pequeno Grupo Explorador. Três Patrulhas com 7 elementos cada uma. Digamos que o valor da mensalidade seja de 4 Euros, o que não seria um valor alto. Em seis meses, teríamos cerca de 500 Euros para a compra de material de campo. É claro que ainda poderemos contar com nossas tendas e alguma ajuda extra, pois também já estamos a entrar em contacto com outros ex-escuteiros, hoje adultos, para que também sejam dirigentes no agrupamento, não estamos? Desse modo, precisaríamos de esperar meio ano até ao primeiro acampamento de Unidade, contado a partir do momento em que a segunda leva de novatos fosse convocada e começasse a pagar mensalidades. Em todo caso, como no início tudo parace menos fácil, podemos contribuir para a renda do agrupamento de algum modo. Por exemplo: as reuniões, bem ou mal, consomem algum dinheiro. O material para os jogos não costuma cair do céu e nem sempre pode ser adquirido gratuitamente. Para começar, poderíamos custear as primeiras reuniões. Não estamos a falar de nenhum valor elevado.»

— «Concordo. Acho que cada um terá de se esforçar um pouco e, no começo, nada é tão fácil assim.»

— «Então, vejamos se tu ainda concordas comigo. Nos primeiros meses, a prioridade seria adquirir o material de campo conveniente a uma Unidade?»

— «Certamente. E creio que já tenhamos um número suficiente de interessados para que comecemos, tanto em se tratando de dirigentes como de escuteiros.»

— «Sim, de facto já os temos. E que mais falta?»

— «Também já consegui autorização para usar as dependências de uma escola e, creio eu, num bairro que atende às nossas necessidades em matéria de recursos humanos, de acordo com aquele nosso primeiro diálogo.»

— «Bem... parece que já temos aqueles três elementos: sede, escuteiros e chefes.»

— «Que mais falta?»

— «Creio que já tenhamos um bom número de excelentes ideias para começar. Devemos constituir o Conselho de Pais e, além de seguir a burocracia necessária, planearmos nossas primeiras reuniões.»

— «Estou de pleno acordo. Mas quanto a criar uma Patrulha? Estou a falar do animal totem, por exemplo.»

— «É aconselhável que eles escolham somente animais que se encontrem em nossa região, no caso de uma Patrulha de exploradores, que é justamente o nosso caso. Podemos preparar-lhes uma lista. Isso os ajudará bastante. No caso de uma Equipa de pioneiros, [no Brasil] eles podem escolher um acidente geográfico ou uma tribo indígena. Quanto a um acidente geográfico, também seria de bom-senso eleger um que se encontrasse em nossa região. Um mapa ou carta topográfica ajudá-los-ia muito. No caso de uma Flotilha, escolhem-se animais marinhos (tubarão, etc.) ou relacionados com o mar (gaivota, etc.) que vivam na região. No caso de um Frota, é boa ideia escolher somente acidentes geográficos intimamente relacionados com o mar. Por exemplo: uma ilha, uma praia, uma restinga, uma ponta, uma enseada. De preferência, o mais perto possível da sede do agrupamento ou ao alcance da Equipagem. Quanto ao grito, todos devem ter uma letra curta, nada muito demorado, mas que seja uma espécie de cartão de visitas que a Patrulha usa para se apresentar. Devemos imaginar a reacção de outras Patrulhas, principalmente de outros agrupamentos, diante do grito de uma Patrulha.»

— «Quando entrámos para a Frota de nosso antigo agrupamento, já não havia Marinheiros, mas herdamos os nomes das Equipagens e as bandeirolas. Infelizmente não havia registo em lugar algum do grito de cada Equipagem.»

— «O que viemos a saber recentemente é que os gritos eram em Tupi-Guarani. Eis aí uma excelente ideia para gritos de Equipa, principalmente se for escolhida alguma denominação indígena como nome.»

— «Creio que muitas Equipas teriam tido inveja de nós se tivéssemos herdado esses gritos em Tupi-Guarani. Nunca tinha ouvido falar em nada parecido.»

— «Nem eu. Mas o grito sempre deveria ser composto na língua da denominação indígena escolhida. Seria muito estranho se fosse de outro modo. Em nossa cidade há índios, tu sabes, e talvez não seja díficil fazer uma visita à tribo (principalmente se formos até lá com funcionários do Concelho). Eles, os índios, seriam as melhores pessoas para nos dizer se conseguimos compor uma letra na língua deles. Não é difícil de encontrar uma gramática de Tupi-Guarani numa biblioteca pública, e talvez não seja difícil de achar os rudimentos da língua na Internet para compormos um simples grito.»

— «Realmente seria um diferencial.»

— «Seria uma tradição se começássemos assim. Afinal, uma tradição começa desde o primeiro dia e, em breve, deveremos ter um Grupo Pioneiro para receber os ex-elementos do Grupo Explorador.»


2

— «Agora, deixa-mo entender melhor. Depois de convocada a segunda leva de interessados para formarmos as primeiras Patrulhas, esperaremos ainda cerca de seis meses até ao nosso primeiro acampamento de Unidade, certo?»

— «Certo.»

— «Sendo assim, que faremos nesse ínterim? Outra Unidade não esperaria tanto assim...»

— «Teremos algumas saídas de campo, como excursões em que praticaremos de antemão muitas técnicas que utilizaremos no primeiro acampamento de Unidade. Lembra-te de que os ensinaremos com antecedência o máximo possível de coisas praticáveis num acampamento, como o uso de lampião e fogareiro, facão e machada e, principalmente, cozinha. Não queremos comer mal, queremos? Vejo que teu estômago concorda com o meu. Pois bem! Nos últimos três meses desse período de deis meses, também faremos aquele primeiro acampamento com os Guias e sub-Guias, de modo que não tenhamos um grande número de "pata-tenras" em nosso primeiro acampamento de Unidade e possamos deixar, o mais possível, cada Patrulha nas mãos de seus Guias e sub-Guias. Essa é a melhor maneira de não sermos babysisters. Desejamos ser chefes, estou certo? A profissão de babysister, embora muito bonita, não deve ser sinónimo de chefia. É claro que estaremos sempre lá para o caso de algum imprevisto, mas o objectivo é que eles aprendam a depender o menos possível de terceiros. Quanto mais uma Patrulha souber viver por conta própria, isto é, como unidade autónoma, melhor. Creio que para tudo isso seis meses não seja um período de tempo exagerado, mesmo que outra Unidade se lançasse a um acampamento logo no primeiro mês, deixando para depois, incrivelmente, as actividades mais simples, como as excursões.»

— «Tens razão. Há muito para ser feito antes, se desejamos seguir a ordem natural das coisas! Parece que a Inteligência manda agir assim...»

— «A primeira metada desse período de seis meses dará ênfase às reuniões de Grupo, de modo que os aspirantes da segunda leva possam ser instruídos a fim de fazer as provas da Etapa de Adesão. Nesse momento, já teremos as Patrulhas formadas (digamos três, com 7 elementos cada uma). Estaremos então a instruir a Secção através dos Guias. Será uma novidade para todos. E daremos início à competição entre Patrulhas. Quanto às saídas de campo, elas devem começar a ocorrer ainda na primeira metade desse período de seis meses, mas, mesmo nessas actividades, não deixaremos de instruir os aspirantes através de seus Guias para que façam as provas da Etapa de Adesão, propiciando-lhes nós, é claro, os respectivos jogos. Se antes desse período de seis meses havia reuniões com a primeira leva de interessados, eram reuniões de Patrulha aplicadas pelo chefe e o assistente. Quanto à instrução, instruíamos os rapazes como se fôssemos o Guia e o sub-Guia, e daí o veradeiro Guia e o verdadeiro sub lideravam suas metades da Patrulha durante os jogos. É boa ideia numerar os jovens de uma Patrulha, de modo que o número 1 seja o Guia e o 2, o sub; os restantes escuteiros recebem os números subsequentes. Sempre que a Patrulha for dividida em duas, os números ímpares ficam com o Guia, e os números pares, com o sub. Sobre essa numeração, q.v. Escutismo Para Rapazes. Mas, ainda naquele período inicial em que contaremos apenas com a primeira leva, já teremos algumas saídas de campo.»

— «Vejo que, em matéria de excelentes ideias, estamos bem servidos.»

— «Mas ainda não falámos tudo sobre o primeiro acampamento da Unidade. Falta polir algo aqui e ali...»

— «Creio que tenhas pensado um pouco mais a fundo sobre os cuidados que já mencionaste a esse respeito, de modo que tudo vá bem.»

— «Ou para que cheguemos o mais perto possível disso. Afinal, não queremos traumatizar nossos escuteiros logo na primeira grande actividade!»

— «Lembro-me de um Moço que, em seu primeiro acampamento, pediu que lhe deixassem voltar a casa. Alguma coisa não era o que ele esperava e, infelizmente, ele só descobriu isso no último momento. Aquela actividade, de facto, terminou com um escuteiro a menos.»

— «Antes que façamos nosso primeiro acampamento, devemos de facto realizar algumas actividades menores. Servirão como preparação. E mesmo essas actividades menores terão seus próprios preparativos, tanto quanto possível, através de reuniões favoráveis.»

— «Que queres dizer com reuniões favoráveis?»

— «Num acampamento normal, e não numa "borga de turistas", os escuteiros terão de praticar cozinha e pioneirismo, além de fazer uso de machadas, facões e lampiões. Também devem, obviamente, estar habituados a lidar com tendas e tudo o mais que seja necessário. Pois bem! Para tudo tem sua primeira vez, mas, definitivamente, um acampamento não é a melhor ocasião para os estreantes em cozinha, por exemplo.»

— «Claro! Queremos evitar o caos!»

— «Então, antes de acampar, devemos praticar cada uma dessas técnicas citadas anteriormente em actividades menores. Para isso, servem muito bem as excursões e saídas de campo em geral.»

— «Há chefes que diriam: — "Mas não é na prática que se aprende? Porque preocuparmo-nos com isso? Na hora tudo se ajeita!" Ou, para citarmos aqueles que conhecem nossas diretrizes e bases: — "No Movimento Escutista aprendemos fazendo!" Como se alguém nascesse sabendo cozinhar, fazer nós e trabalhos de pioneirismo!» diz Ròmeo, com bom humor. «Esses chefes certamente aprenderam com o grande chefe Quim!»

- "Uma coisa é aprender fazendo; outra é deixar os escuteiros completamente desassistidos quando precisam de nós! Além do mais, um chefe deve planear as actividades e reuniões de sua Unidade e, quando digo planear, não é apenas assinalar uma data no calendário; é fazer o programa de actividades ou reuniões, observando o que se quer a longo prazo. Definitivamente, não estou a falar de ver a relva crescer...»

— «Mas que poderíamos fazer de bom antes mesmo do primeiro acampamento de Unidade e dessas actividades menores?»

— «Por exemplo: nós os ensinaremos a fazer ligações durante as reuniões na sede. Numa actividade menor, em que não haja pernoite, farão uma pequeno trabalho de pioneirismo. Assim ganha-se tempo nessa actividade, porque ter-nos-emos preparado para ela durante uma reunião de Grupo na sede. Desse modo, pioneirismo não lhes será novidade em seu primeiro acampamento. E, se o tópico dessa pequena actividade for realmente pioneirismo, poderemos levar lanche frio de modo que não tenhamos de nos preocupar com cozinhar. Mas, se o tópico for cozinha de campo, então cozinhar será a principal coisa a fazer durante o dia. Porém, tudo que pudermos iniciar já na sede, durante as reuniões de Grupo, não deve ser deixado para depois.»

— «Então, realmente não haverá nenhuma novidade quando eles acamparem pela primeira vez?»

— «A grande novidade será praticar tudo isso numa só actividade. Queremos que eles se sintam o mais à vontade possível em actividades de campo. Não queremos, de modo algum, que eles sofram ou aprendam da pior maneira possível. O chefe Quim talvez dissesse: — "No meu primeiro acampamento, eu tive de me desenrascar sozinho e aprender tudo à pancada. Não vejo porque com meus escuteiros deva ser diferente. Creio que eu me tenha tornado um bom escuteiro afinal!"»

— «Da maneira como estás a falar, vejo que nossos escuteiros saberão melhor que o Quim Novato o que fazer quando estiverem acampados. Creio que assim não dependerão muito de nós e, sinceramente, não tenho vocação para babysister.»

— «Tão-pouco eu. Mas, ainda quanto a novidades, eles terão seu primeiro fogo de conselho, seu primeiro pernoite e seu primeiro jogo nocturno. Ainda assim, vamos ir quebrando o gelo aos poucos. Quando houver o fogo de conselho, é desejável que eles já estejam familiarizados com "sketches", por exemplo.»

— «O chefe Quim, ou melhor, a Mamãe Passarinho Quim empurra seus filhotes para fora do ninho antes que eles saibam voar.»

— «Seria uma óptima maneira de fazer tudo errado.»

— «Uma excelente maneira de dar com os burros n'água, queres dizer.»

— «Seguramente. Quanto mais concorremos para que eles adquiram habilidades num mínimo de técnicas escutistas que um acampamento exige, melhor.»

Nenhum comentário:

Postar um comentário